3a – Assim cantamos
Assim cantamos e escrevemos
nas cartas e nas paredes.
Porque nem vida nem sonhos
cabem nas malhas das redes
que o inimigo nos lança.
Temos coisas na lembrança
que cantamos tantas vezes.
Ao ponto de ser mais branca
uma canção sobre os meses
que uma pomba em pleno voo.
Velha canção que eu entoo
vinda não se sabe donde.
Até que um dia em seu voo
descubro um verso que esconde
raiva e amor misturados.
Como se fossem recados
de um preso em sua prisão
ou dos gaiatos roubados
de sangue, sonhos e pão
sem alegria, cantando.
Porque o canto anda contando
a quem tem sangue nas veias
como se destrói o mando
e se assaltam as ameias
de quem nos quer sitiar.
E por ser dito a cantar
não é menos verdadeiro.
Andam pombas a voar
no coração guerrilheiro
que pela Paz, faz a guerra.
Homem que nunca se enterra
nem no chão nem na lembrança
nem quando a arma se emperra
e a bala sai rosa-esperança
pelo cano do poema.
Poesia de
Manuel Correia
Manuel Freire interpretou “Assim cantamos”, no disco "De volta".
Aqui poderá ouvir a versão desta canção inserta no LP "Devolta", com a interpretação de Manuel Freire, 1978.